segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Morales diz que vitória o obriga a acelerar processo de mudança na Bolívia

La Paz, 6 dez (EFE).- O presidente da Bolívia, Evo Morales, disse hoje que a vitória obtida nas eleições gerais, que ganhou com mais de 60% dos votos segundo as pesquisas, o obriga a "acelerar" o "processo de mudança" que empreende há quatro anos em seu país.

* EFE

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http://noticias.uol.com.br/ultnot/efe/2009/12/07/ult1808u150194.jhtm

domingo, 6 de dezembro de 2009

Com forte apoio popular, Morales mantém a Bolívia no rumo da transformação

The New York Times
Simon Romero e Andres Schipani
Em La Paz (Bolívia)

Apesar das frases e pôsteres de Che Guevara, isto aqui não é a Havana de 1969, nem a Manágua de 1979. Em vez disso, o fervor nos escritórios do Vice-Ministério de Descolonização só poderia ser sentido na Bolívia do presidente Evo Morales, que parece rumar tranquilamente para uma vitória eleitoral neste domingo.

Os dizeres nas paredes daqui estão em duas línguas indígenas - quéchua e aimará - sinais inconfundíveis do movimento político que abalou as instituições deste empobrecido país.

"Jisk'a Achasiw Tuq Saykat Taqi Jach'a P'iqincha", diz a saudação no escritório de Monica Rey, que explica que este é o nome, em aimará, da nova unidade que ela chefia, o Diretorado para a Luta Contra o Racismo.

"Estamos no processo de conquistar as mentes de nosso país, e ainda mais desafiador que isso, os seus medos", disse Rey, listando uma variedade de novos projetos, incluindo a troca dos retratos nas cédulas do país. Saem os homens brancos que por muito tempo governaram o país, e entram heróis indígenas como Tupac Katari e Bartolina Sisa, líderes de uma revolta contra o domínio espanhol no século 18.

Evo Morales, presidente da Bolívia

* Aizar Raldes/AFP


Com uma oposição bastante enfraquecida e sua conexão visceral com a maioria indígena - que corresponde a mais de 60% da população - pode-se dizer que Morales, 50, é o líder mais forte que o país tem em décadas.

Este ano, ele venceu facilmente uma reforma constitucional que o permitiu concorrer a outro mandato de cinco anos. Agora, enquanto os bolivianos se preparam para votar neste domingo, as pesquisas mostram que ele e seus aliados estão bem na frente. Morales tem a seu alcance sólidas maiorias legislativas que o permitiram moldar ainda mais o país na qualidade de presidente indígena aimará.

Mas esta mesma liderença rendeu a Morales alguns rivais que não esperava, além da oposição que ele enfrenta por parte das elites tradicionais nas planícies rebeldes do leste. A ampliação de sua influência também é sentida como opressiva por uma variedade de políticos indígenas que lutam para sair de sua sombra.

"Este governo exite para gastar dinheiro nas campanhas de Evo às custas de todos nós", disse Felipe Quispe, 67, índio aimará que entrou na política depois de liderar uma guerrilha nos anos 80 e ser preso nos 90. "Evo é um índio vestido com roupas elegantes, cercado por homens brancos e mestiços."

O icônico Quispe, que comanda um partido radical com uma pequena porcentagem de eleitores, disse que os aimará, que são cerca de um quarto da população de 9,8 milhões da Bolívia, deveriam rejeitar a própria ideia de Bolívia e formar uma terra natal com o povo que fala a língua aimará nos altiplanos do Peru. "Precisamos nos desbolivianizar", disse ele.

Ricardo Calla, antropólogo e ministro de assuntos indígenas em um governo anterior, disse que da mesma forma que Quispe ficou à esquerda do presidente, outros políticos indígenas emergiram em todo o campo ideológico, sugerindo uma classe política mais variada do que a apresentada pela mídia estatal daqui.

No centro, por exemplo, está Savina Cuellar, governadora de uma província no sul da Bolívia. À direita está Vyctor Hugo Cardenas, ex-vice-presidente cuja casa foi atacada por um grupo pró-Morales este ano. Mais à direita ainda, está Fernando Untoja, um intelectual aimará que concorre ao Congresso na coligação de Mandred Reyes Villa, um ex-capitão do exército que está em segundo lugar, bem distante de Morales.

"O próprio Evo", disse o antropólogo Calla, "poderia ser considerado como esquerda autoritária". Contribuindo para essa classificação, ele argumentou, está a resistência de Morales em cooperar com outros partidos, ameaças de prender oponentes e o elogio à sua administração numa propaganda paga pelo governo. Calla chamou a ostentação do governo quanto às conquistas de Morales de "um culto de personalidade" em formação.

O "Cambio", um jornal diário controlado pelo Estado criado por Morales este ano e semelhante ao Granma de Cuba, oferece um exemplo desse exibicionismo. Sua principal matéria do último domingo descrevia a localidade de Puerto Evo Morales, um assentamento pioneiro no norte. Um encarte de história em quadrinhos, "Evo: Do Povo Para o Povo", contava como Morales saiu da pobreza.

Há motivos concretos para a popularidade de Morales. O principal pode ser o crescimento sustentado da economia da Bolívia, que conseguiu aplausos dos economistas, impressionados com seu acúmulo de mais de US$ 7 bilhões (US$ 12 bilhões) de reservas em moeda, mesmo embora o país continue sofrendo com níveis persistentes de pobreza extrema.

Apesar da crise financeira e de uma queda nos rendimentos com a exportação de gás natural, estima-se que a economia da Bolívia tenha crescido até 4% este ano, uma das maiores taxas da região, ajudada pelo estímulo aos programas de bem-estar para crianças, mulheres grávidas e idosos.

"Até o FMI está feliz com a economia da Bolívia; imagine a ironia disso", disse Gonzalo Chavez, um economista boliviano formado em Harvard, referindo-se à crítica frequente de Morales sobre as instituições multilaterais de Washington, como o Fundo Monetário Internacional.

Ainda assim, a tensa relação diplomática entre Washington e Morales é uma das piores no hemisfério, mesmo com a chegada do governo Obama. A embaixada dos EUA aqui continua sem embaixador desde a expulsão de Philip S. Goldberg no ano passado, e operações antidrogas conjuntas foram interrompidas depois que Morales acusou o Departamento Antidrogas de espioná-lo.

Esta semana, ele deu uma entrevista coletiva para jornalistas estrangeiros na qual passou a maior parte do tempo criticando o acordo militar do governo Obama com a Colômbia e o apoio dos EUA à eleição presidencial em Honduras. E ele pareceu cético quanto à uma reconciliação, dizendo que um encontro com o presidente Barack Obama seria "desejável mas não decisivo".

A influência de Morales sobre a sociedade é evidente na cidade de Warisata, onde outro projeto, a Universidade Indígena Tupac Katari, estende-se entre os altiplanos do país.

O campus, com uma visão estonteante do pico Illampu, com seu cume nevado, enfatiza a instrução em aimará e ecoa os sentimentos do partido de Morales, o Movimento para o Socialismo. Colado numa porta, um informe diz que alunos e funcionários são obrigados a comparecer a um curso intensivo sobre o "Capital" de Karl Marx; sanções ameaçam aqueles que não comparecerem.

"O que a invasão europeia e o sistema colonial nos trouxe?", perguntou David Quispe, 37, que ministra um curso sobre a visão de mundo andina.

"A exploração capitalista e racista!", um grupo de alunos respondeu em uníssono, segurando o livro "Indian Thesis" de Fausto Reinaga.

"Aqui os jovens índios estão acostumados a ficarem quietos", disse Quispe depois da aula. "Esse é o momento de eles começarem a falar."

Tradução: Eloise De Vylder

sábado, 5 de dezembro de 2009

Apoio do Brasil foi fundamental para Evo, que deve obter vitória, diz pesquisador


Haroldo Ceravolo Sereza
Do UOL Notícias
Em São Paulo

Há pouco mais de um ano, a Bolívia vivia sob forte tensão. Uma escalada de violência, iniciada em 2007, culminou com a morte de pelo menos 11 apoiadores do presidente Evo Morales em setembro do ano passado.

  • Daniel Caballero/Reuters

    Comício em El Alto, no último dia da campanha eleitoral oficial na Bolívia

Boa parte da população dos departamentos da chamada Medialuna (Meia-Lua) - Santa Cruz, Pando, Tarija e Beni, de maioria não indígena - reivindicavam uma autonomia que, para Evo e seu partido, o MAS (Movimento ao Socialismo), com forte identidade étnica indígena, podia descambar para a divisão do país.

Uma Assembleia Constituinte em que o MAS tinha maioria, mas não maioria absoluta, tinha dificuldades para chegar ao texto final da Constituição (em janeiro de 2009, o texto final, defendido por Evo Morales, foi finalmente a referendo, e acabou aprovado por 61,43% dos votos).

Com apoio dos países da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), Evo conseguiu isolar os "separatistas" da Medialuna. O apoio foi fundamental, diz o historiador Pinheiro de Araujo, autor de estudo em que compara os partidos de Evo Morales e de Hugo Chávez (Partido Socialista Unido de Venezuela). Além disto, para ele, os líderes que defendiam a autonomia tensionaram demais o processo e acabaram por se isolar.

Processo conturbado
O atual presidente boliviano, avalia Pinheiro de Araújo, deve sair vencedor no primeiro turno da eleição, que acontece neste domingo (06), depois de um ano relativamente tranquilo, para os padrões bolivianos. Apesar da crise, a Bolívia está em claro crescimento econômico. Não houve grandes protestos e os principais adversários de Evo, Manfred Reyes Villa (direita) e Samuel Doria Medina (centro-direita) não são dos departamentos em que o presidente enfrenta maior oposição.

O historiador lembra que a ascensão de Evo Morales seguiu um ritmo conturbando, com protestos populares contra a privatização do sistema de água (em 2000), em Cochabamba, e contra a exportação de gás via Chile, rival histórico, para os Estados Unidos (2003). Esses episódios ganharam os nomes, respectivamente, de Guerra da Água e Guerra do Gás na disputa política boliviana.

Em 2005, o presidente Carlos Mesa foi afastado, após nova crise envolvendo a questão do gás. Em 2006, Morales ocupou as refinarias da Petrobras e nacionalizou o recurso natural. Depois, convocou uma Constituinte. Para Pinheiro de Araújo, Morales tinha condições de lutar para que a nova Constituição fosse aprovada por maioria simples, mas acreditou que conseguiria 2/3 nas votações. "Houve uma soberba do MAS", avalia.

Para o historiador, é possível aproximar os governos de Chávez e de Morales, mas há diferenças significativas entre eles.

De forma resumida, pode-se dizer que Morales depende mais do movimento popular para manter-se à frente do Estado - é a intensa mobilização da sociedade boliviana que levou e mantém Evo à frente do país, enquanto Chávez é quem organiza a mobilização para promover sua revolução bolivariana. "Evo é fruto de um movimento que é maior que ele; caso não existisse, outras lideranças, como Roman Loyaza, dirigente do movimento dos cocaleiros, poderiam estar à frente do processo", diz.

"Eles têm uma linha de ação comum: um programa antineoliberal. Apostam na integração latino-americana e defendem um nacionalismo de esquerda", diz. Mas na prática, as políticas são diferentes: Evo enfatiza os valores indígenas e a antiguidade incaica, enquanto para Chávez a integração é mais econômica e política.

Brasil
Para a Venezuela, o Brasil é mais um parceiro, enquanto o Brasil é visto na Bolíva como "imperialista".

"Evo vê o Brasil e Lula como aliados, mas sua base vê as empresas brasileiras como atores do imperialismo", explica. "Uma coisa é o atual governo, outra são as empresas."

Isso explica em boa medida a decisão de ocupar as plantas da Petrobras no país. Evo enfrenta não apenas oposição à direita, mas também à esquerda, expressa sobretudo pelo MIP (Movimento Indígena Pachakuti).

Para o MIP, Evo é, no mal sentido da palavra, o Lula boliviano, um líder que freia a mobilização e a revolução.

Eleições em São Paulo
No Brasil, 18,6 mil bolivianos estão cadastrados para votar. Eles representam cerca de 10% do eleitorado que se registrou fora da Bolívia para participar das eleições. Além de Brasil, foram cadastros eleitores na Espanha, Argentina e Estados Unidos.

Todos os eleitores bolivianos votam em São Paulo. São cinco locais de votação: Escola Estadual Domingos Faustino Sarmiento (r. Vinte e um de Abril, 970, Brás), Escola Estadual Marechal Deodoro (r. dos Italianos, 405, Bom Retiro), Escola Estadual Orestes Guimarães (r. Canindé, 153, Canindé), Escola Municipal Antônio Sampaio (av. Voluntários da Pátria, 733, Santana) e Memorial da América Latina (av. Auro Soares de Moura Andrade, 664, Barra Funda).

O local de votação foi informado, segundo Jorge Gonzales, representante da Corte Nacional Eleitoral em São Paulo, a todos os eleitores. Além disto, na entrada dos locais de votação haverá um ponto de orientação informatizado, para informar em que mesa é a votação. Informações também podem ser obtidas no site http://www.cne.org.bo ou nos telefones 3331-3303 e 0800-761-1595.

Os recintos eleitorais abrem às 8h e fecham às 17h.

Oposição chega enfraquecida às eleições

Os candidatos da oposição boliviana chegam ao primeiro turno das eleições deste domingo com poucas chances de vitória, segundo pesquisas de opinião.

Os principais opositores ao governo do presidente da Bolívia, Evo Morales, são da região chamada de "Meia Lua", no leste do país, e criticados por não terem discurso nacional que atraia, sobretudo, as camadas mais pobres da população, reunidas no Altiplano boliviano.

A "Meia Lua" concentra os departamentos (Estados) de Santa Cruz, Tarija, Beni e Pando. Os dois principais candidatos opositores, Manfred Reys Villa, do Plano Progresso para Bolívia (PPB-CN), e Samuel Medina, da Unidade Nacional (UN), encerraram suas campanhas em Santa Cruz, produtora de gás e petróleo e bastião da oposição ao governo central.

Reys Villa Ex-prefeito e ex-governador de Cochabamba, no centro do país, Manfred Reys Villa, que foi militar, é o principal opositor de Evo neste pleito. Segundo as pesquisas de opinião, como a do instituto Equipos Mori, ele teria cerca de 20% das intenções de voto e Morales pouco mais de 50%.

Na reta final da campanha, o presidente disse que Manfred Reys seria "preso" depois da eleição por supostos atos de corrupção. Ministros da equipe de Morales disseram que o opositor teria comprado passagens para escapar do país.

"Isso não é verdade. Quero ser presidente da Bolívia e não fugir do meu país", afirmou.

Nesta sexta-feira, o ministro de Governo, Alfredo Rada, divulgou uma gravação na qual o opositor ofereceria US$ 150 mil a uma pessoa, cuja identidade não foi revelada, para conseguir votos domingo.

Reys Villa defende maior "segurança jurídica" para as empresas e um país mais "produtivo".

"Com nosso governo e não com o governo do MAS (Movimento ao Socialismo), partido de Evo, teremos um país mais prospero", disse.

Samuel Medina A bandeira da campanha do terceiro candidato nesta disputa eleitoral, Samuel Doria Medina, é a de estimular os pequenos empreendimentos. Ele também defendeu aumento da produção e exportação de alimentos.

"São quase os únicos no mundo sem agrotóxicos", disse. Doria Medina é economista e empresário e, como Reys Villa, crítico do governo Morales.

"Votem em mim e vamos deixar o governo do MAS no passado", declarou. Os dois acusaram Morales de usar a máquina pública para fazer campanha.

Nesta sexta-feira, quando a campanha já tinha, oficialmente, terminado, o presidente entregou tratores a militares, em Cochabamba, e prometeu campos de futebol para os mineiros de Potosí.

"Não estou desrespeitando as regras eleitorais. Pra mim, a campanha terminou. Estou aqui como presidente do país", disse Morales em Potosí.

Dificuldades Para o analista político José Luis Galvez, a oposição teve dificuldades para eleger seu candidato e acabou se apresentando dividida.

"Mas qualquer um que se apresentasse teria problemas (políticos). O governo Morales não deixa espaço para a oposição e dificilmente aceitará idéias diferentes às suas", disse.

Setores da oposição ganharam protagonismo na política local, defendendo a autonomia econômica de suas regiões. Foram meses de disputas e conflitos políticos e sociais.

O líder daquele movimento, o ex-prefeito de Santa Cruz, Ruben Costas, não disputa estas eleições. Para Costas e seus aliados, Morales realiza um governo "populista" e "dominado pelas orientações" do presidente Hugo Chávez, da Venezuela.


segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Equador e Bolívia são casos de sucesso em meio à crise global


Equador e Bolívia são casos de sucesso em meio à crise global

Adivinhem qual país das Américas deve atingir o crescimento econômico mais rápido nesse ano? A Bolívia. O primeiro presidente indígena do país, Evo Morales, foi eleito em 2005 e assumiu o cargo em janeiro de 2006. Bolívia, o país mais pobre da América do Sul, seguiu os acordos com o FMI [Fundo Monetário Internacional] por 20 anos consecutivos e sua renda per-capita ao final desde período era mais baixa do que 27 anos antes. E o Equador tem atingido saudáveis 4,5% de crescimento durante os dois primeiros anos da presidência de Correa. O artigo é de Mark Weisbrot, do The Guardian.

Texto em português publicado no Correio Internacional

De acordo com a sabedoria convencional transmitida diariamente na imprensa econômica, os países em desenvolvimento deveriam se desdobrar para agradar as corporações multinacionais, seguir a política macroeconômica neoliberal e fazer o máximo para atingir um grau de investimento elevado e, assim, atrair capital estrangeiro.

Adivinhem qual país das Américas deve atingir o crescimento econômico mais rápido nesse ano? A Bolívia. O primeiro presidente indígena do país, Evo Morales, foi eleito em 2005 e assumiu o cargo em janeiro de 2006. Bolívia, o país mais pobre da América do Sul, seguiu os acordos com o FMI [Fundo Monetário Internacional] por 20 anos consecutivos e sua renda per-capita ao final desde período era mais baixa do que 27 anos antes.

Evo descartou o FMI apenas três meses depois de assumir a presidência e então nacionalizou a indústria de hidrocarbonetos (especialmente gás natural). Não é preciso dizer que isso não agradou a comunidade corporativa internacional. Também foi mal vista a decisão do país de se retirar do painel de arbitragem internacional do Banco Mundial em maio de 2007, cujas decisões tinham tendência a favorecer as corporações internacionais em detrimento dos governos.

A nacionalização e os crescentes lucros advindos dos royalties dos hidrocarbonetos, no entanto, têm rendido ao governo boliviano bilhões de dólares em receita adicional (o PIB total da Bolívia é de apenas 16,6 bilhões de dólares, para uma população de 10 milhões de habitantes). Essas rendas têm sido úteis para a promoção do desenvolvimento pelo governo, e especialmente para manter o crescimento durante a crise. O investimento público cresceu de 6,3% do PIB em 2005 para 10,5% em 2009.

O crescimento da Bolívia em meio à crise mundial é ainda mais notável, já que o país foi atingido em cheio pela queda de seus preços dos produtos de exportação mais importantes – gás natural e minerais – e também por uma perda de espaço no mercado estadunidense. A administração Bush cortou as preferências comerciais da Bolívia, que eram concedidas dentro do Pacto Andino de Promoção do Comércio e Erradicação das Drogas [ATPDA, na sigla em inglês], supostamente para punir a Bolívia por sua insuficiente cooperação na “guerra contra as drogas”.

Na realidade, foi muito mais complicado: a Bolívia expulsou o embaixador estadunidense por causa de evidências do apoio dado pelo governo estadunidense à oposição ao governo de Morales; a revogação do ATPDA aconteceu logo em seguida. De qualquer maneira, a administração Obama ainda não mudou com relação à política da administração Bush para a Bolívia. Mas a Bolívia já provou que pode se virar muito bem sem a cooperação de Washington.

O presidente de esquerda do Equador, Rafael Correa, é um economista que, muito antes de ser eleito em dezembro de 2006, entendeu e escreveu a respeito das limitações do dogma econômico neoliberal. Ele tomou posse em 2007 e estabeleceu um tribunal internacional para examinar a legitimidade da dívida do país. Em novembro de 2008 a comissão constatou que parte da dívida não foi legalmente contratada, e em dezembro Correa anunciou que o governo não pagaria cerca de 3,2 bilhões de dólares da sua dívida internacional.

Ele foi tiranizado na imprensa econômica, mas a operação foi bem sucedida. O Equador cancelou um terço da sua dívida externa declarando moratória e reembolsando os credores a uma taxa de 35 centavos por dólar. A avaliação para o crédito internacional do país continua baixa, mas não mais do que antes da eleição de Correa, e até subiu um pouco depois que a operação foi completada.

O governo de Correa também causou a fúria dos investidores estrangeiros ao renegociar seus acordos com empresas estrangeiras de petróleo para captar uma parte maior dos lucros com a alta dos preços do petróleo. E Correa resistiu à pressão feita pela petrolífera Chevron e seus poderosos aliados em Washington para retirar seu apoio a um processo contra a empresa por supostamente poluir águas subterrâneas, com danos que poderiam exceder 27 bilhões de dólares.

Como o Equador está se saindo? O crescimento tem atingido saudáveis 4,5% durante os dois primeiros anos da presidência de Correa. E o governo tem garantido a redistribuição da renda: gastos com saúde em relação ao PIB dobraram e gastos sociais em geral têm sido expandidos consideravelmente de 4,5% para 8,3% do PIB em dois anos. Isso inclui a duplicação do programa de transferência de renda às famílias pobres, um aumento de 474 milhões de dólares em despesas de habitação, e outros programas para famílias de baixa renda.

O Equador foi atingido fortemente por uma queda de 77% no preço das suas exportações de petróleo de junho de 2008 até fevereiro de 2009, assim como pelo declínio das remessas de capital provenientes do exterior. Apesar disso, o país superou as adversidades muito bem. Outras políticas heterodoxas, juntamente com a moratória da dívida externa, têm ajudado o Equador a estimular sua economia sem esgotar suas reservas.

A moeda do Equador é o dólar estadunidense, o que descarta a possibilidade de políticas cambiais e monetárias para esforços contra-cíclicos numa recessão – uma deficiência relevante. Em vez disso, o Equador foi capaz de fazer acordos com a China para um pagamento adiantado de 1 bilhão de dólares por petróleo e mais 1 bilhão de empréstimo.

O governo também começou a exigir dos bancos equatorianos que repatriassem algumas de suas reservas mantidas no exterior, esperando trazer de volta 1,2 bilhões e tem começado a repatriar 2,5 bilhões das reservas estrangeiras do banco central para financiar outro grande pacote de estímulo econômico.

O crescimento do Equador provavelmente será de 1% esse ano, o que é muito bom em relação à maior parte de seu hemisfério. O México, por exemplo, no outro lado do espectro, tem projetado um declínio de 7,5% no seu PIB em 2009.

A maior parte dos relatórios e até análises quase-acadêmicas da Bolívia e do Equador dizem que eles são vítimas de governos populistas, socialistas e “anti-americanos” – alinhados com a Venezuela de Hugo Chávez e Cuba, é claro – e estão no caminho da ruína. É claro que ambos os países ainda têm muitos desafios pela frente, dos quais o mais importante será a implementação de estratégias econômicas que diversifiquem e desenvolvam suas economias no longo prazo. Mas eles começaram bem, dedicando à ordem econômica e política externa convencionais – na Europa e nos Estados Unidos – o respeito que ela merece.

Tradução: Raquel Tebaldi/Correio Internacional

sábado, 17 de outubro de 2009

Morales e Chávez desafiam Obama a honrar Nobel suspendendo bloqueio a Cuba

Cochabamba (Bolívia), 17 out (EFE).- Os presidentes da Bolívia, Evo Morales, e da Venezuela, Hugo Chávez, desafiaram hoje o chefe de Estado americano, Barack Obama, a fazer por merecer o Nobel da Paz recém-conquistado suspendendo o bloqueio econômico imposto a Cuba.

Tanto Morales como Chávez, que participam da cúpula da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba), disseram que os Estados Unidos deveriam suspender o embargo, imposto em 1962.

"Obama não merece (o Nobel). É preciso ver o acontece nos próximos anos. Veremos se ele o merece", afirmou o chefe de Estado venezuelano.

Por sua vez, Morales desafiou Obama suspender o bloqueio contra Cuba e lembrou que, em 28 de outubro, as Nações Unidas votarão a favor ou contra da continuidade da medida.

"Só dois países rejeitam a suspensão do bloqueio econômico: Israel e EUA. Obama tem que cumprir este mandato do mundo e suspender o embargo econômico. Ele tem dois caminhos: se submeter ao mundo ou se submeter a Israel", afirmou.

Os países da aprovarão hoje uma declaração contra o bloqueio econômico e comercial dos EUA a Cuba durante a cúpula que acontece na cidade de Cochabamba, no centro da Bolívia.

sábado, 22 de agosto de 2009

Bolívia inclui Brasil em planos de extração industrial de lítio no Salar de Uyuni

VILLA TUNARI, Bolívia, 22 Ago 2009 (AFP) - Bolívia e Brasil fecharam neste sábado um acordo para impusionar a industrialização da extração de lítio no Salar de Uyuni, gigantesca reserva do mineral cuja exploração é atualmente disputadas por empresas francesas, coreanas e japonesas, informou o presidente, Evo Morales.

O anúncio foi feito durante o encontro de Morales com Luiz Inácio Lula da Silva, que foi à Bolívia para a assinatura de uma série de acordos bilaterais no povoado cocaleiro de Villa Tunari.

"Saudamos o grande interesse do presidente Lula e de seu governo de nos unirmos para explorar o lítio. É um dos acordos que estamos assinando, para que possamos (...) impulsionar a industrialização do lítio na zona de Uyuni", afirmou Morales.

Segundo dados do Poder Executivo boliviano, o Salar - maior deserto de sal do mundo com 12.000 km2 - guarda cerca de 140 milhões de toneladas de lítio. Um estudo do Serviço Geológico dos Estados Unidos, no entanto, indica que apenas 5,5 milhões de toneladas foram comprovadas.

A fabulosa reserva, que ainda está em fase de quantificação plena, já despertou o interesse de empresas multinacionais, como as japonesas Mitsubishi e Sumitomo, a sul-coreana LG e a francesa Bolloré, que já negociam com o governo boliviano a última fase de um projeto de industrialização.

domingo, 2 de agosto de 2009

Evo Morales apóia Correa e Chávez contra Colômbia

LA PAZ, Bolívia, 2 Ago 2009 (AFP) - O presidente da Bolívia, Evo Morales, defendeu neste domingo seus aliados Rafael Correa e Hugo Chávez das denúncias sobre supostos vínculos de Equador e Venezuela com a guerrilha das Farc, e acusou o governo colombiano de Alvaro Uribe de fazer o jogo dos Estados Unidos.

"Isto é uma campanha suja do Império" americano, disse Morales durante uma concentração de camponeses na região de Santa Cruz, ao comentar as denúncias de Bogotá de que Caracas e Quito teriam ligações com a guerrilha colombiana.

"No computador (de uma guerrilheira colombiana) encontraram que as Farc financiaram a campanha do presidente Correa", mas isto "é uma armação para desprestigiar os presidentes revolucionários".

Morales assinalou que a versão, que já conhecia "há umas duas semanas", é um "instrumento do império" contra o países da região, e tem o apoio do governo de Alvaro Uribe.

Bogotá divulgou um vídeo, de 2008, no qual aparece o chefe militar das Farc, Jorge 'Mono Jojoy' Briceño, citando o envio de dinheiro para a campanha presidencial de Correa.

O presidente boliviano também questionou a versão colombiana, do final de julho, sobre a apreensão com as Farc de armas anticarro de fabricação sueca vendidas ao Exército da Venezuela.

"Quem acredita nisto? É uma campanha suja que vem do Imperio (EUA)", insistiu o presidente boliviano, que citou ainda as denúncias que sofreu o presidente da Guatemala, Alvaro Colom, após a morte de um advogado opositor, e o golpe de Estado que derrubou o presidente hondurenho, Manuel Zelaya.
UOL Celular

sábado, 1 de agosto de 2009

Lula adia viagem à Bolívia para 22 de agosto

da France Press, em La Paz

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva adiou para 22 de agosto sua viagem à Bolívia, informou neste sábado o presidente boliviano Evo Morales, destacando que o objetivo da visita é firmar um convênio de crédito rodoviário de 322 milhões de dólares.

"A chegada do presidente Lula estava prevista para o dia 9 de agosto, mas adiou porque é o Dia dos Pais no Brasil, e, seguramente, vai estar com sua família, mas nos disse que vai chegar em 22 de agosto", revelou Morales.

Os dois líderes devem se encontrar no povoado de Villa Tunari, no departamento central de Cochabamba, para firmar um convênio de crédito de US$ 322 milhões de dólares para construir a estrada que ligará o centro boliviano à Amazônia.

A construção da estrada, de mais de 400 km, ficará a cargo da construtora brasileira OAS.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Brasil aumenta importação de gás boliviano para termelétricas

Rio de Janeiro, 1 mai (EFE).- O Brasil aumentará nos próximos dias o volume de gás natural que importa da Bolívia para poder pôr em funcionamento diversas termelétricas que estavam inativas, anunciou hoje a Petrobras.

Segundo a diretora de Gás e Energia da Petrobras, Graça Foster, a importação do combustível boliviano voltará a ser elevada para 30 milhões de metros cúbicos diários, capacidade máxima do gasoduto entre os dois países, em aproximadamente duas semanas.

Atualmente, com a queda da demanda nacional de gás em consequência da crise econômica global e, como as termelétricas estão desativadas, o Brasil vem importando cerca de 24 milhões de metros cúbicos diários do combustível boliviano.

Segundo Graça Foster, como as chuvas dos primeiros meses do ano permitiram que as hidrelétricas do sul do país operassem com sua capacidade máxima, as termelétricas, cujo custo de geração é maior, foram desativadas.

No entanto, uma seca nas últimas semanas reduziu o nível das represas das hidrelétricas e, para compensar, Brasil terá que aumentar, a partir da próxima semana, a energia gerada pelas termelétricas até cerca de 2,2 mil megawatts.

Para isso, precisará de cerca de 14 milhões de metros cúbicos de gás natural adicionais diariamente, parte dos quais virá da Bolívia e outra parte de uma produção maior na bacia de Campos.
UOL

terça-feira, 28 de abril de 2009

Oposição pede que a Interpol investigue suposto complô para assassinar Evo Morales

El País
Maite Rico
Em Madri

Uma explosão estrondosa quebrou o silêncio em Santa Cruz. Depois os tiros estalaram no Hotel Las Americas, no centro da capital do leste boliviano. Não houve gritos. Só disparos durante 20 minutos.

Horas depois, nessa manhã de 16 de abril, o presidente da Bolívia, Evo Morales, aterrissava em Cumaná (Venezuela) para participar da cúpula bolivariana.

"Me informam que nesta madrugada houve um tiroteio no qual caíram três estrangeiros e dois foram detidos", anunciou no aeroporto, escoltado pelo venezuelano Hugo Chávez e o cubano Raúl Castro.

Era uma trama "da direita", disse, para atentar contra ele e o vice-presidente. "Mandaram bomba e bala. Resistiram."

Os cadáveres perfurados de Eduardo Rózsa Flores, húngaro-boliviano; Árpad Magyarosi, húngaro, e Michael Dwyer, irlandês, ainda jaziam no quarto andar do hotel, nus ou de cuecas. O comando de elite havia levado para La Paz dois sobreviventes: o boliviano-croata Mario Tadic Astorga e outro húngaro, Elod Toaso.

Começava assim uma das tramas mais confusas e tenebrosas da história recente da Bolívia.

Não era a primeira vez que Evo Morales denunciava uma conjuração para assassiná-lo. Mas desta vez havia três estrangeiros mortos.

Imediatamente depois do assalto, a polícia encontrou um arsenal de fuzis e explosivos no recinto de feiras da cidade.

O comando "da ultradireita fascista", disseram as autoridades, também fora o autor do atentado, dois dias antes, contra a casa do cardeal de Santa Cruz, Julio Terrazas.

O vice-presidente Álvaro García Linera apontou as baterias contra os dirigentes da rica região autonomista, bastião da oposição a Morales.

Os protestos dos cruzenhos ficaram afogados quando a televisão húngara transmitiu uma entrevista gravada meses antes por Eduardo Rózsa, na qual o chefe dos supostos mercenários anunciava que ia para Santa Cruz ajudar na defesa da cidade e da autonomia regional contra um eventual ataque do governo.

O perfil obscuro de Rózsa se encaixa perfeitamente nessa intriga. Filho de húngaro e de boliviana, 40 anos, estudou letras em Budapeste e Moscou. Trabalhou para o serviço secreto húngaro e foi jornalista na guerra da Croácia, onde acabou empunhando armas, recebeu honras e foi acusado de matar um fotógrafo suíço. Havia se convertido ao islamismo. Seu blog é uma vitrine de suas crenças confusas: defende com ardor a causa palestina e o Irã, detesta o comunismo e o liberalismo e acredita que Hugo Chávez traz "ar fresco". Seu amigo Ilich Ramírez, o famoso terrorista Carlos, lamenta em um site na web a morte de Rózsa e rejeita que seja "um sicário da extrema-direita".

A entrevista de Rózsa derrubava a tese do magnicídio ("não me interessa tirar Evo Morales", diz), mas reforçava a idéia de que alguém em Santa Cruz pretendia organizar uma espécie de "autodefesa" contra os grupos de choque governistas.

As peças não param de se encaixar. A evidência pericial, o relatório da seguradora do hotel e o testemunho do administrador contradizem a versão oficial. O comando dinamitou as portas dos quartos 456, 457 e 458 antes de abrir fogo, sem que os hóspedes tivessem possibilidade de reagir.

Rózsa, Magyarosi e Dwyer podem ter sido vítimas de uma execução extrajudicial.

E, longe de ser "o assalto em flagrante" a que o governo alude, tratou-se de uma ação calculada. O circuito de câmeras de vigilância foi desligado. Alguém teve acesso ao sistema de informática do hotel e apagou as gravações desde a terça-feira, 14, quando os estrangeiros chegaram ao hotel. Também eliminaram os registros na internet. Tudo isso sem ordem judicial. "É uma operação de alto nível, no mais puro estilo cubano", diz um especialista em inteligência que pede para manter o anonimato.

A promotoria cruzenha não pôde intervir, nem mesmo na remoção dos cadáveres. Parece já descartado, além disso, que o grupo tenha atentado contra o cardeal Terrazas. Na noite do ataque nenhum deles saiu do hotel.

"Se queriam investigar, por que liquidar essas pessoas, em vez de prendê-las?", pergunta-se o presidente do Senado, o opositor Óscar Ortíz. Os líderes de Santa Cruz, encabeçados pelo governador Rubén Costas, denunciam uma armação do governo contra o movimento autonomista, em um ano em que Evo Moraes tentará se reeleger, em dezembro.

Um documento recebido na última quinta-feira pelo jornal "La Razón", assinado por um "comandante Gonzalo", que diz fazer parte do grupo, afirma que a segurança do Estado boliviano contatou Rózsa na Espanha em agosto de 2008.

A oposição exigiu a intervenção da Interpol, que já ofereceu sua ajuda, para garantir uma investigação independente. Enquanto isso, na sexta-feira, o governo enviava um contingente de 1.500 soldados para Santa Cruz.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
UOL

Bolívia e Paraguai assinam acordo sobre fronteira

da France Presse, em Buenos Aires

Os presidentes da Bolívia, Evo Morales, e do Paraguai, Fernando Lugo, assinaram nesta segunda-feira, em Buenos Aires, um acordo que fixa os limites fronteiriços entre os dois países. A disputa pela rica região do Chaco já causou uma guerra que deixou mais de 100.000 mortos na década de 30.

Morales e Lugo assinaram o memorando final elaborado pela Comissão Demarcadora de Limites de Bolívia e Paraguai, cuja missão foi concluída em 2007, em uma cerimônia solene na Casa Rosada, sede do governo argentino. O documento foi entregue aos mandatários pela presidente da Argentina, Cristina Kirchner.

Lugo, Morales e Kirchner destacaram em seus discursos a atual unidade e paz entre os países sul-americanos e que a origem do conflito entre Paraguai e Bolívia foi o interesse estrangeiro nos recursos energéticos da região.

Morales afirmou que "as guerras [na região] vêm de fora, promovidas pelas multinacionais, por grupos oligárquicos que disputam nossos recursos naturais".

Lugo destacou que é preciso consolidar a paz regional para que "nunca mais os interesses externos" desequilibrem a América do Sul.

Kirchner advertiu que os interesses das poderosas companhias estrangeiras ainda ameaçam a paz: "A guerra entre Paraguai e Bolívia não foi uma exceção. Teve cheiro de petróleo, como tantas guerras do passado e de agora também".

A Guerra do Chaco (1932-1935), entre Bolívia e Paraguai, foi uma disputa em torno do Chaco Boreal, rico em hidrocarbonetos, tendo de um lado a americana Standard Oil e do outro a anglo-holandesa Royal Dutch Shell.

O Tratado de Paz, Amizade e Limites foi assinado em 1938 entre Paraguai e Bolívia para estabelecer a criação de uma comissão mista para definir a linha divisória entre os dois países.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Evo Morales fica isolado contra o narcotráfico

El País
Javier Lafuente
Em Madri
A saída da Bolívia dos agentes antidroga americanos, expulsos por Morales, aumenta o temor de que os cartéis se fortaleçam no país andino

No hotel Los Tucanes, na província boliviana de Chapare, vão sentir saudade de alguns hóspedes habituais que desde o início de fevereiro provavelmente não apareceram mais por lá. Nessa área "cocalera" [de plantadores de coca], uma das mais importantes da Bolívia, costumavam se hospedar alguns dos cerca de 50 agentes do departamento antidrogas dos EUA (DEA na sigla em inglês) que atuavam no centro da Bolívia e que o governo de Evo Morales decidiu expulsar em 1º de novembro passado, depois de acusá-los de realizar "espionagem e conspiração" contra seu Executivo.

Desde então, os agentes americanos tinham 90 dias de prazo para voltar para casa. Hoje não fica rastro da DEA na Bolívia. Isto é, não fica nada dos serviços que durante mais de 35 anos compartilharam inteligência operacional e estratégica com a polícia local, dando à Bolívia "o equipamento necessário para localizar e destruir fábricas de produção de drogas ilegais" e rastreando seu movimento, segundo indica a agência em um comunicado explicando o motivo de sua expulsão.

Muito pouca gente estranhou a decisão de Morales. A tensão acumulada em suas relações com os EUA desde que chegou ao poder fazia prever uma medida assim. Os cocaleros de Chapare já tinham dado um aviso prévio com a expulsão em junho dos membros da agência americana de cooperação Usaid. "Os funcionários da DEA operavam na Bolívia sem nenhum controle estatal. Suas operações de inteligência eram duvidosas. Demonstramos em várias oportunidades que funcionários da DEA estavam ligados a operações encobertas de narcotráfico", defende-se o ministro da Presidência, Juan Ramón Quintana.

A primeira consequência da ordem a Washington não demorou. Apenas um mês depois, o então presidente George W. Bush excluiu a Bolívia do sistema de preferências alfandegárias, do qual se beneficiava desde 1989 e que facilita as exportações para os EUA, um dos mercados mais importantes do país andino.

Além dos efeitos que isso possa ter na economia boliviana, o que mais preocupa em nível internacional é o vazio que vai deixar a ausência da DEA na luta contra o narcotráfico, sobretudo no que se refere ao controle da cocaína. "Nossa polícia e nossas forças armadas têm capacidade operacional suficiente para combater o narcotráfico", afirma o ministro do governo, Alfredo Rada, em conversa telefônica.

Segundo o encarregado da polícia no Executivo de Morales, isso não se conseguirá somente usando as forças armadas. "Vamos nacionalizar a luta contra o narcotráfico, os métodos e as estratégias serão decididas pelos bolivianos, não admitiremos ingerências", explica Rada, e acrescenta: "Não nos fechamos à participação da comunidade internacional; a única coisa que pedimos é que se respeite a soberania nacional".

A opinião de Rada contrasta com o mal humor dos que operam contra o narcotráfico e consideram que a rede criada durante mais de três décadas pela agência americana foi praticamente para o ralo em 90 dias. "Nenhum país tem a capacidade logística da DEA. Desde que os expulsaram, seus antigos delatores tentam contatar as agências européias", explicam fontes policiais estrangeiras que atuam na Bolívia. "Ninguém trabalha como os americanos, muito poucos pagam por informações, a não ser que sejam muito relevantes", acrescentam as mesmas fontes.

O número de fábricas de cocaína que a Força Especial de Luta contra o Narcotráfico boliviana apreendeu com apoio da DEA, segundo a agência americana, aumentou para 6.535 em 2008, 950% a mais desde 2000, quando foram apreendidas 622.

Apesar desses dados, também há quem reduza seu entusiasmo. "A DEA não estava tão preocupada como pode parecer em erradicar o cultivo da coca. Eles têm detectado perfeitamente que o destino da cocaína é a Europa, e apenas 2% vão para os EUA", afirma um dirigente estrangeiro que trabalhou nos últimos cinco anos na Bolívia. Durante esse tempo, insiste, "a DEA afrouxou muito a tensão na luta contra o narcotráfico".

No relatório anual sobre narcotráfico, o Departamento de Estado dos EUA expressa sua preocupação pela crescente influência dos cartéis colombianos e mexicanos na Bolívia.

Por que Morales decidiu expulsar a DEA? O governo baseia seus argumentos na "ingerência" dos funcionários americanos que, segundo Rada, "se intrometeram para desestabilizar" o Executivo de Morales. Há quem acredite que a razão corresponde mais a uma estratégia política. "Evo está mais pendente da ideologia bolivariana do que das consequências que possa ter esse alinhamento" com países como Venezuela ou Equador, denuncia o deputado opositor Rodrigo Paz.

Evidenciando a dialética típica da política, um dos motivos de maior peso é que Morales é o líder das seis federações de cocaleros do país, que representam uma rede com muito poder nas bases do MAS, o partido do presidente. "Nunca houve na Bolívia um projeto tão bem-sucedido quanto o dos cocaleros, que conseguiram elevar ao mais alto um dos seus", opina o dirigente estrangeiro.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Na Bolívia, um tesouro inexplorado encontra o nacionalismo

The New York Times
Simon Romero
Em Uyuni (Bolívia)
Na corrida para criação da próxima geração de carros híbridos ou elétricos, tanto fabricantes de automóveis quanto os governos que buscam reduzir sua dependência do petróleo estrangeiro se vêem diante de um fato sério: quase metade do lítio do mundo, o mineral necessário para impulsionar os veículos, é encontrado na Bolívia - um país que pode não estar disposto a cedê-lo facilmente.

As empresas japonesas e europeias estão ocupadas tentando fechar acordos para explorar o recurso, mas o sentimento nacionalista em relação ao lítio está crescendo rapidamente no governo do presidente Evo Morales, um ardoroso crítico dos Estados Unidos que já nacionalizou os setores de petróleo e gás natural da Bolívia.

* Noah Friedman-Rudovsky/The New York Times

Montes de sal em Salar do Uyuni

* Veja outras fotos

Por ora, o governo fala em controlar rigidamente o lítio e manter os estrangeiros acuados. Aumentando a pressão, os grupos indígenas aqui no remoto deserto de sal onde o mineral se encontra estão buscando uma participação no eventual lucro.

"Nós sabemos que a Bolívia pode se tornar a Arábia Saudita do lítio", disse Francisco Quisbert, 64 anos, o líder da Frutcas, o sindicato dos extratores de sal e produtores de quinua nas margens de Salar do Uyuni, o maior deserto de sal do mundo. "Nós somos pobres, mas não somos camponeses estúpidos. O lítio pode ser da Bolívia, mas também é de nossa propriedade."

A nova Constituição que Morales conseguiu que fosse aprovada no mês passado reforça essas reivindicações. Um de seus artigos poderia dar aos índios o controle sobre os recursos naturais de seu território, fortalecendo sua habilidade de obter concessões das autoridades e empresas privadas, ou mesmo bloquear projetos de mineração.

Nada disso minimiza os esforços dos estrangeiros, incluindo os conglomerados japoneses Mitsubishi e Sumitomo, e um grupo liderado pelo industrial francês Vincent Bolloré. Nos últimos meses, todos os três enviaram representantes a La Paz, a capital, para discutir com o governo Morales o acesso ao lítio, um componente crítico para as baterias que fazem funcionar os carros e outros aparelhos eletrônicos.

"Há lagos de sal no Chile e na Argentina, e um depósito promissor de lítio no Tibete, mas o prêmio está claramente na Bolívia", disse Oji Baba, um executivo da Unidade de Metais Básicos da Mitsubishi, em La Paz. "Se quisermos ser uma força na próxima onda de automóveis e das baterias que os moverão, então temos que estar aqui."

A Mitsubishi não é a única planejando produzir carros usando baterias de íon-lítio. As fabricantes de automóveis americanas em dificuldades estão depositando suas esperanças no lítio. Uma delas é a General Motors, que no próximo ano planeja apresentar seu Volt, um carro usando bateria de íon-lítio juntamente com um motor a gasolina. Nissan, Ford e BMW, entre outras fábricas, possuem projetos semelhantes.

A demanda por lítio, há muito usado em pequenas quantidades em medicamentos estabilizadores do humor e armas termonucleares, aumentou à medida que os fabricantes de baterias para BlackBerrys e outros dispositivos eletrônicos passaram a usar o mineral. Mas a indústria automotiva possui o maior potencial inexplorado para o lítio, dizem os analistas. Como ele pesa menos que o níquel, que também é usado em baterias, ele permitiria aos carros elétricos armazenar mais energia e percorrerem distâncias maiores.

Com os governos, incluindo o de Obama, buscando aumentar a eficiência dos combustíveis e reduzir a dependência de petróleo importado, as empresas privadas estão concentrando sua atenção neste canto desolado dos Andes, onde os índios de língua quéchua subsistem do que resta de um antigo mar interno, extraindo o sal que carregam em caravanas de lhamas.

O Levantamento Geológico dos Estados Unidos diz que 5,4 milhões de toneladas de lítio poderiam potencialmente ser extraídas na Bolívia, em comparação a 3 milhões no Chile, 1,1 milhão na China e apenas 410 mil nos Estados Unidos. Geólogos independentes estimam que a Bolívia pode até ter mais lítio em Uyuni e seus outros desertos de sal, apesar das altitudes elevadas e a qualidade das reservas poderem dificultar o acesso ao mineral.

Apesar das estimativas variarem enormemente, alguns geólogos dizem que os fabricantes de carros elétricos poderiam explorar os depósitos de lítio da Bolívia por muitas décadas.

Mas em meio a tamanho potencial, os estrangeiros que buscam explorar os depósitos de lítio bolivianos devem lidar com as políticas de Morales, 49 anos, que já entrou repetidas vezes em choque com investidores americanos, europeus e até mesmo sul-americanos.

Morales chocou o vizinho Brasil, com que mantém termos amistosos, ao nacionalizar os projetos de gás natural do país em 2006 e buscar um forte aumento dos preços. Ele realizou sua mais recente nacionalização antes da votação da Constituição, enviando soldados para ocuparem as operações da gigante britânica de petróleo BP.

Na sede em La Paz da Comibol, a agência estatal que supervisiona os projetos de mineração, a visão de Morales de combinar socialismo com a defesa dos índios bolivianos está em exposição de forma proeminente. Cópias do "Cambio", um novo jornal estatal, estão disponíveis no saguão, enquanto pôsteres de Che Guevara, o ícone esquerdista morto na Bolívia em 1967, estão presentes na entrada dos escritórios da Comibol.

"O modelo imperialista anterior de exploração de nossos recursos naturais nunca mais se repetirá na Bolívia", disse Saúl Villegas, chefe da divisão da Comibol que supervisiona a extração de lítio. "Talvez haja a possibilidade dos estrangeiros aceitarem ser parceiros minoritários, ou melhor, nossos clientes."

Para isso, a Comibol está investindo cerca de US$ 6 milhões em uma pequena usina perto da aldeia de Río Grande, na margem do Salar do Uyuni, onde espera iniciar o primeiro esforço em escala industrial da Bolívia para extrair o lítio da paisagem branca, semelhante à lunar, e processá-lo em carbonato para as baterias.

Os técnicos primeiro precisam trazer a salmoura, a água saturada de sal encontrada nas profundezas sob o deserto de sal, para a superfície, onde ela é evaporada em tanques para expor o lítio. Morales quer a usina concluída até o final deste ano.

Os operários daqui estavam em um frenesi para cumprir a meta durante o final de janeiro, trabalhando sob o sol ao redor de paredes de tijolos inacabadas. Durante uma refeição de guisado de lhama e uma Pepsi, Marcelo Castro, 48 anos, o supervisor do projeto, explicou que além do processamento de lítio, a usina tinha outro objetivo.

"É claro, o lítio é o mineral que nos conduzirá para a era pós-petróleo", disse Castro. "Mas para podermos seguir por essa estrada, nós temos que elevar a consciência revolucionária de nosso povo, começando pelo piso desta fábrica."

Além da minúscula usina, os analistas de lítio dizem que a Bolívia, um dos países menos desenvolvidos da América Latina, precisa investir muito mais para iniciar a produção do carbonato. Mas com a desaceleração do crescimento econômico e a queda nos preços do petróleo limitando a ajuda de sua principal benfeitora, a Venezuela, não se sabe quanto a Bolívia será capaz de fazer por conta própria.

Ainda assim, apesar de Morales estar exercendo um maior controle sobre a economia e assumindo os projetos de petróleo e gás, analistas otimistas do setor apontam que ele permitiu que algumas empresas estrangeiras permanecessem no país como parceiras minoritárias.

A exploração de lítio na Bolívia tem sua própria história de altos e baixos. No início dos anos 90, a oposição nacionalista supostamente liderada por Gonzalo Sánchez de Lozada, um rico detentor de concessões de mineração que posteriormente se tornou presidente da Bolívia, minou um plano da Lithco, uma empresa americana, de explorar os depósitos de lítio daqui.

Essa história, somada às atuais tensões de Morales com Washington, podem ajudar a explicar por que as empresas americanas parecem estar de lado enquanto outras buscam acordos de lítio aqui. Sánchez de Lozada no final foi forçado a renunciar como presidente em 2003, após Morales ter liderado protestos contra seus esforços para exportar gás natural com a ajuda de capital estrangeiro.

Enquanto a Bolívia estuda como explorar seu lítio, países com reservas menores estão aumentando a produção. A China despontou como maior produtora de lítio, explorando reservas encontradas em um deserto de sal tibetano.

Mas geólogos e economistas estão debatendo ferozmente se as reservas de lítio fora da Bolívia são suficientes para atender a demanda global crescente. Keith Evans, um geólogo da Califórnia, argumenta que os recursos de lítio acessíveis fora da Bolívia são significativamente maiores do que as estimativas do Levantamento Geológico dos Estados Unidos.

Juan Carlos Zuleta, um economista em La Paz, disse: "Nós temos as reservas de lítio mais magníficas do planeta, mas se não entrarmos na corrida agora, nós perderemos esta chance. O mercado encontrará outras soluções para as necessidades de bateria do mundo".

No deserto de sal de Uyuni, esse debate parece remoto para aqueles que ainda trabalham da mesma forma que seus ancestrais, raspando o sal do solo em pilhas em formato de cone que se alinham no horizonte como uma miragem geométrica. O lítio encontrado abaixo da superfície deste deserto parece ainda mais remoto para estes extratores de sal do século 21.

"Eu ouvi falar do lítio, mas só espero que possa criar trabalho para nós", disse Pedro Camata, 19 anos, com seu rosto protegido do sol inclemente por uma máscara de esqui e óculos escuros baratos cobrindo seus olhos. "Uma pessoa sem trabalho aqui está morta."

Tradução: George El Khouri Andolfato