terça-feira, 28 de abril de 2009

Oposição pede que a Interpol investigue suposto complô para assassinar Evo Morales

El País
Maite Rico
Em Madri

Uma explosão estrondosa quebrou o silêncio em Santa Cruz. Depois os tiros estalaram no Hotel Las Americas, no centro da capital do leste boliviano. Não houve gritos. Só disparos durante 20 minutos.

Horas depois, nessa manhã de 16 de abril, o presidente da Bolívia, Evo Morales, aterrissava em Cumaná (Venezuela) para participar da cúpula bolivariana.

"Me informam que nesta madrugada houve um tiroteio no qual caíram três estrangeiros e dois foram detidos", anunciou no aeroporto, escoltado pelo venezuelano Hugo Chávez e o cubano Raúl Castro.

Era uma trama "da direita", disse, para atentar contra ele e o vice-presidente. "Mandaram bomba e bala. Resistiram."

Os cadáveres perfurados de Eduardo Rózsa Flores, húngaro-boliviano; Árpad Magyarosi, húngaro, e Michael Dwyer, irlandês, ainda jaziam no quarto andar do hotel, nus ou de cuecas. O comando de elite havia levado para La Paz dois sobreviventes: o boliviano-croata Mario Tadic Astorga e outro húngaro, Elod Toaso.

Começava assim uma das tramas mais confusas e tenebrosas da história recente da Bolívia.

Não era a primeira vez que Evo Morales denunciava uma conjuração para assassiná-lo. Mas desta vez havia três estrangeiros mortos.

Imediatamente depois do assalto, a polícia encontrou um arsenal de fuzis e explosivos no recinto de feiras da cidade.

O comando "da ultradireita fascista", disseram as autoridades, também fora o autor do atentado, dois dias antes, contra a casa do cardeal de Santa Cruz, Julio Terrazas.

O vice-presidente Álvaro García Linera apontou as baterias contra os dirigentes da rica região autonomista, bastião da oposição a Morales.

Os protestos dos cruzenhos ficaram afogados quando a televisão húngara transmitiu uma entrevista gravada meses antes por Eduardo Rózsa, na qual o chefe dos supostos mercenários anunciava que ia para Santa Cruz ajudar na defesa da cidade e da autonomia regional contra um eventual ataque do governo.

O perfil obscuro de Rózsa se encaixa perfeitamente nessa intriga. Filho de húngaro e de boliviana, 40 anos, estudou letras em Budapeste e Moscou. Trabalhou para o serviço secreto húngaro e foi jornalista na guerra da Croácia, onde acabou empunhando armas, recebeu honras e foi acusado de matar um fotógrafo suíço. Havia se convertido ao islamismo. Seu blog é uma vitrine de suas crenças confusas: defende com ardor a causa palestina e o Irã, detesta o comunismo e o liberalismo e acredita que Hugo Chávez traz "ar fresco". Seu amigo Ilich Ramírez, o famoso terrorista Carlos, lamenta em um site na web a morte de Rózsa e rejeita que seja "um sicário da extrema-direita".

A entrevista de Rózsa derrubava a tese do magnicídio ("não me interessa tirar Evo Morales", diz), mas reforçava a idéia de que alguém em Santa Cruz pretendia organizar uma espécie de "autodefesa" contra os grupos de choque governistas.

As peças não param de se encaixar. A evidência pericial, o relatório da seguradora do hotel e o testemunho do administrador contradizem a versão oficial. O comando dinamitou as portas dos quartos 456, 457 e 458 antes de abrir fogo, sem que os hóspedes tivessem possibilidade de reagir.

Rózsa, Magyarosi e Dwyer podem ter sido vítimas de uma execução extrajudicial.

E, longe de ser "o assalto em flagrante" a que o governo alude, tratou-se de uma ação calculada. O circuito de câmeras de vigilância foi desligado. Alguém teve acesso ao sistema de informática do hotel e apagou as gravações desde a terça-feira, 14, quando os estrangeiros chegaram ao hotel. Também eliminaram os registros na internet. Tudo isso sem ordem judicial. "É uma operação de alto nível, no mais puro estilo cubano", diz um especialista em inteligência que pede para manter o anonimato.

A promotoria cruzenha não pôde intervir, nem mesmo na remoção dos cadáveres. Parece já descartado, além disso, que o grupo tenha atentado contra o cardeal Terrazas. Na noite do ataque nenhum deles saiu do hotel.

"Se queriam investigar, por que liquidar essas pessoas, em vez de prendê-las?", pergunta-se o presidente do Senado, o opositor Óscar Ortíz. Os líderes de Santa Cruz, encabeçados pelo governador Rubén Costas, denunciam uma armação do governo contra o movimento autonomista, em um ano em que Evo Moraes tentará se reeleger, em dezembro.

Um documento recebido na última quinta-feira pelo jornal "La Razón", assinado por um "comandante Gonzalo", que diz fazer parte do grupo, afirma que a segurança do Estado boliviano contatou Rózsa na Espanha em agosto de 2008.

A oposição exigiu a intervenção da Interpol, que já ofereceu sua ajuda, para garantir uma investigação independente. Enquanto isso, na sexta-feira, o governo enviava um contingente de 1.500 soldados para Santa Cruz.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
UOL

Bolívia e Paraguai assinam acordo sobre fronteira

da France Presse, em Buenos Aires

Os presidentes da Bolívia, Evo Morales, e do Paraguai, Fernando Lugo, assinaram nesta segunda-feira, em Buenos Aires, um acordo que fixa os limites fronteiriços entre os dois países. A disputa pela rica região do Chaco já causou uma guerra que deixou mais de 100.000 mortos na década de 30.

Morales e Lugo assinaram o memorando final elaborado pela Comissão Demarcadora de Limites de Bolívia e Paraguai, cuja missão foi concluída em 2007, em uma cerimônia solene na Casa Rosada, sede do governo argentino. O documento foi entregue aos mandatários pela presidente da Argentina, Cristina Kirchner.

Lugo, Morales e Kirchner destacaram em seus discursos a atual unidade e paz entre os países sul-americanos e que a origem do conflito entre Paraguai e Bolívia foi o interesse estrangeiro nos recursos energéticos da região.

Morales afirmou que "as guerras [na região] vêm de fora, promovidas pelas multinacionais, por grupos oligárquicos que disputam nossos recursos naturais".

Lugo destacou que é preciso consolidar a paz regional para que "nunca mais os interesses externos" desequilibrem a América do Sul.

Kirchner advertiu que os interesses das poderosas companhias estrangeiras ainda ameaçam a paz: "A guerra entre Paraguai e Bolívia não foi uma exceção. Teve cheiro de petróleo, como tantas guerras do passado e de agora também".

A Guerra do Chaco (1932-1935), entre Bolívia e Paraguai, foi uma disputa em torno do Chaco Boreal, rico em hidrocarbonetos, tendo de um lado a americana Standard Oil e do outro a anglo-holandesa Royal Dutch Shell.

O Tratado de Paz, Amizade e Limites foi assinado em 1938 entre Paraguai e Bolívia para estabelecer a criação de uma comissão mista para definir a linha divisória entre os dois países.